sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Pastel Clarice... hummm!

Sonhar é simples, lembrar-se do sonho (para muita gente, não para mim) é uma tarefa delicada, compreendê-los, diria, é um processo criptográfico, mas nada que uma boa metáfora não venha dar uma mãozinha...

Dizem que todo mundo sonha pra caramba, ainda que existam aqueles que encham a boca pra dizer “não sonho nada!”. Bom, eu abro a boca pra dizer que sonho pra caramba, porque toda santa manhã me acordo com ao menos uma história no regaço do pijama, louca pra achar alguém a quem contar.

Esta semana, por exemplo, depois de decidir aprender de fato a cozinhar, sonhei com uma pérola da culinária, já vivenciada por alguns amigos na realidade (né, Kiu?!), a que chamei carinhosamente de Pastel Clarice. Mas não fui eu quem cozinhou desta vez; apenas batizei a receita.

Era noite. Estávamos Conrado, eu e outros amigos (acordei sem saber direito quem, mas, possivelmente, eram Artur, Carol e Brenda, porque o clima do ambiente é o que existe quando coexistimos) num lugar agradável, meio cingido de preto, com detalhes vermelhos e uma luz dourada que iluminava o ambiente na medida exata. Havia muita gente no local, mas era possível conversar sem precisar subir a voz, e a conversa entre nós rolava solta. Ocupamos uma mesa redonda no canto de uma das paredes, que ostentavam pequenos quadros com molduras escuras e foscas, mesmo tom de todos os móveis da casa.

Ocupávamos aquele espaço já há um bom tempo, quando fizemos outro de nossos pedidos, uma rodada de pastel. O garçom, como de costume nos bares daqui, serviu um a um na medida em que o pedido ficou pronto, e não a todos nós de uma mesma vez. O primeiro pedido a chegar foi justamente o de Conrado, que despertou água na boca do grupo e o desejo ardente de que nos servissem logo...

De olho no pastel de Conrado, notei que do retângulo da massa dourada sobravam dois finos fios de ébano. O meu impulso foi o de quem dá uma beliscadinha: puxar aquela sobra torradinha e levar à boca para amainar o desejo de comer enquanto o meu prato não chegava. No trajeto do prato à boca, Con partiu o pastel com os talheres e, contrastando com o dourado da casca e com o acolchoado do queijo derretido, supostamente o seu único recheio, repousava em sonhos ardentes uma negra e rechonchuda barata, com antenas grandes como as de uma lagosta, e sem duas das pernas, absortas entre as pontas dos meus dedos e viajando em alta velocidade em direção à minha boca.

A visão da barata me trouxe à tona. Acordei de supetão, pela força do asco, e fui direto para o banheiro lavar as mãos, aliviada por não ter comido as pernas da barata... Obviamente, voltei para o quarto no meio do caminho. Ora, lavar as mãos por conta de um sonho! Alô, realidade! O sonho já acabou! Mas a vontade era de voltar a dormir para saber o final da história...

Diante da impossibilidade, e conhecendo a gente como nos conheço, comecei a visualizar o final. Eu, engulhando, iria para o banheiro morrendo de rir, esticando a mão direita o mais longe de mim; Conrado deitaria delicadamente os talheres sobre o prato, faria cara de asco e giraria a cabeça de um lado pra o outro, semicerrando os olhos; Carol torceria o nariz e emitiria o clássico som do "argh!"; Artur me acompanharia no riso, aliviado por não ter testado a textura da bichana, poria a mão direita na boca, apontaria para mim com o indicador da outra mão e aboticaria ainda mais os olhos, já naturalmente aboticados; Brenda, por sua vez, deitaria furiosamente as duas mãos sobre a mesa, giraria o dedo indicador da mão direita no ar, em espiral, num leve piti, deixando todos os outros clientes cientes da inóspita criatura e no direito de receberem de volta suas rodadas de pastéis (afinal, "barata só anda em bando, meu bem!", frase que diria ao gerente e com a qual ganharia a causa coletiva).

Antes de voltar a dormir de novo, desta vez para sonhar com tartarugas marinhas imensas vistas da varanda de minha casa (detalhe indispensável: moro num segundo andar a pelo menos 3 quilômetros do mar), fiquei pensando a respeito do porquê desse sonho. Não me veio à mente outra resposta: adoro pastel, adoro Clarice e só desejo o melhor para Conrado.

Metáforas são metáforas...
O que vale é a intenção, e a minha, juro, foi das melhores.

5 comentários:

Conrado Falbo disse...

ufa, ainda bem que foi sonho...

Me disse...

Não é... mas bem que a gente podia sair para comer pastel, para pôr à prova o meu poder de predição.

Anônimo disse...

=)
amo teus textos The!
saudades imensas!
beijo bem grande :*

Brenno disse...

Ah, se de um pastel -- à la Kafka, à la Clarice -- brotassem sempre histórias assim...

Uma narradora de mão cheia! (A boca cheia, esta quase que fica para o pobre do Conrado...)

Me disse...

Pois é, foi por pouco. No fim das contas, ficamos todos de estômago vazio. Pelo menos salvou-se a história.
:)

Hoje sonhei com computadores 286. Deve ser porque este meu está com um pé na cova... :P