Se eu fosse poeta, versejaria sobre o mundo, mas, como pouco sou, um restolho de nada nesta terra, reservo-me a falar sobre o mudo, o mundo calado dos seres que habitam dentro de mim, sem grandes propósitos, como resta a ser a tudo o que é breve, à semente estéril que jamais voltará a ser fruto enramado em árvore, sequer broto de planta, tampouco um caule que morre só para si, sem ao menos romper o solo, sem chegar a cochichar no ouvido de outrem que não nasceu, mas que teve vida... a vida submersa é um tocar de violino sem ouvidos que escute, mas o ato de tocar segue sendo imprescindível. Tocar imprescinde mais que ouvir... ouvir é conseqüência, e, no mundo (mesmo aos que não rompem o solo do mundilho e se quedam redomados no útero da terra), é mister ser causa...
Hoje, neste lapso de agora que teima em vir e vir e me fez viver 25 anos, com a interrupção mínima de um desmaio – os sonos não me interrompem, porque sonho sonho sonho... –, eis-me aqui, a divagar sobre o vago, sobre a vasta pequenez do que sou e que vive neste mundilho chamando theresa – aprisionado neste corpo pequeno que não escolhi, mas que nem desgosto nem gosto – e com o qual às vezes pouco ou nada ou tudo me identifico...
Adoro vírgulas, acho que porque marcam um compasso, porque nos indicam que nem tudo é retilíneo, que tudo pode acontecer, que as coisas se movem, que nas curvas desta vida alguém nos espera inesperadamente como tudo que verdadeiramente é ganho... auskalo! Viva a mutação! E me salva do vazio dos agoras que se sucedem, às vezes por um período inteiro ausente de vírgulas e sem topar com alguém que me espere em alguma esquina desta vida, o olhar para trás e sentir a presença de auskalo... bom saber o quanto não imaginava do viver e a sucessão dos presentes que me deu... que me venham mais, porque por eles espero com um cantar de rouca mas esperançosa voz e um toque afinado de violino proveniente da fricção entre ser e sentimento...
Aqui me encontro, hoje, a postos para a escritura de mais uma vírgula nas trilhas movediças do meu mundilho... que destra mão me ajudará a fazê-lo?
domingo, 13 de março de 2005
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7 comentários:
Parabéns pelo blog Baby Bird!Os desmaios são como vírgulas a dividir nossas vidas em tantas quantas orações. O que temos de fazer é que essas orações possam ser verdadeiras preces em homenagem ao Beija-Flor Cósmico que nos colocou no Universo.Tenho um orgulho enorme de ter topado com você numa dessas esquinas do Destino. Te amo de verdade, só como os irmãos mais velhos dos céus amam os bebês-pássaros ainda titubeantes no voar.Beijos.
Theresaaaaaaaaaaaaaaa,
Adorei teu blog. :)
Beijos: Naty
Que semelhanças existem entre o som de um violino que não será ouvido e um comentário, decerto tardio, que pouca ou nenhuma esperança tem de ser lido?
Não obstante, o violino soa. Não obstante, o comentário surge.
Limito-me por ora a apontar pontos de luz - sim, existem pontos de luz em meio a vírgulas. As vírgulas, você escreve, marcam o compasso, esboçam curvas. Já os pontos de luz, estes interrompem o passo, paralisam o instante da leitura num momento de espanto luminoso.
Eis um deles:
"Os sonhos não me interrompem, porque sonho sonho sonho".
Auskalo, a palavra basca que agora guardo como uma descoberta. Como não quero passar sem deixar pegadas (porque, afinal, são elas que ficam quando não estamos), uma palavra grega de presente para você, significando algo parecido: clinamen (um desvio no curso dos átomos que torna possível a mudança no universo).
Caso você chegue a ler este comentário perdido no tempo e fora de tempo, mande um sinal de luz ao futuro, ou mande pontos de luz.
Beijos.
Ao apontar o ponto de luz, terminei trocando o sono por um sonho.
Seria, então, assim:
"Os sonos não me interrompem, porque sonho sonho sonho..."
Como será que nascem as estrelas?
E as verrugas, quando erramos ao apontar um ponto de luz?
Há, na sugestão, uma força que contrasta com a sutileza de que é feita.
A transmutação pela qual passa um texto literário, prosa ou verso, é também, parece-me, uma outra faceta da sugestão. Lembro-me do teu último conto, que traz e trás. Os fatos que lhe deram origem eram sumamente simples. Foram, contudo, transfigurados. Em vez de simplesmente relatarem, passaram, então literatura, a sugerir. E não é a sugestão, pensando bem, sempre maior do que o sugerido? A sugestão é, quase sempre, tão grande quanto o olhar que lhe dedicamos. E os nossos olhos, alguém já escreveu, não têm fim...
Se é assim, me pergunto o que se passa quando nos propomos a falar do mudo. Pode-se, talvez, falar do mudo transgredindo-o, ferindo-o no que tem de seu, quebrando-o no momento mesmo em que é feito palavra. Seria, neste caso, uma tentativa vã, como cerrar os dedos em torno do ar: não existe maneira mais rápida de deixá-lo escapar...
Haverá, então, uma maneira de sugerir o mudo com a palavra? É possível, pois assim se dá com toda sugestão, falar do silêncio dizendo menos que o silêncio? É possível, nesse dizer-menos o não-dizer, dizer mais?
E se não for, como é possível isto?
Isto: vês?
"Adoro vírgulas, acho que porque marcam um compasso, porque nos indicam que nem tudo é retilíneo, que tudo pode acontecer, que as coisas se movem, que nas curvas desta vida alguém nos espera inesperadamente como tudo que verdadeiramente é ganho... auskalo!"
"A vida submersa é um tocar de violino sem ouvidos que escute, mas o ato de tocar segue sendo imprescindível. Tocar imprescinde mais que ouvir... ouvir é conseqüência, e, no mundo é mister ser causa..."
Ecos? Não: respostas.
Escutas, Queen Mab? Escutas?
E quem virá aqui ainda, neste último?
Quem virá?
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